quinta-feira, 26 de junho de 2008

Na hora feliz


A fachada não assustava, mas também não era das melhores. É claro que existiam bares bons, freqüentados por bonecas de blazer, pastas e sovaco cheirosinho. Mas todo o glamour que eles queriam eram copos limpos e cerveja gelada. Eram os merecidos chopps de uma sexta-feira e não havia muito tempo a perder. Sentaram do lado de fora até que acabasse o maço de Free para colocar a conversa em dia, em uma das transversais da rua que abrigava os principais escritórios de advocacia, bancos e lojas do centro. Já se aproximava das 18 horas quando pediram a primeira:

- Ôpa, um brinde.
- A quê?
- Sei lá, porra, um brinde à qualquer coisa. Um brinde à minha pica, vai.
- E à minha também.
- E às bubuzinhas.
- Ôpa, verdade. E às bubuzinhas.
- Vistes como terminou aquela cagada lá entre a Moreira Costas e a Vargas?
- Não acompanhei mais aquilo. Tava de saco cheio dessa história.
- Rapaz, um dos acionistas da Vargas acabou contratando um detetive e...
- Meu Deus do céu!

Nem precisou perguntar o que foi ao ver o olhar por detrás da orelha esquerda do amigo. Parou de falar e esperou ela passar para entoar um instintivo “ai, meu Deus”: Saia preta volupiando a bunda, blazer aberto e um suorzinho lhe escorrendo pelo decote. Cabelão de quem visita o salão toda sexta por volta daquele horário, e umas batatas de pernas que já diziam muito do que havia por trás daquele traje executivo.

- Esse aí é o estilão “Gordinha-Esquema”.
- Vá se fuder! Gorda? Puta mulher gostosa, rapá. Essa é o estilo "cavala".
- É, pode ser... Mas deve ser daquele tipo de mulher que não morre de felicidades por esses atributos. Alta, larga, bundão. É um passo para inflar.
- Pois é. Já essa outra – o amigo espera novamente a nova miss adentrar a passarela da calçada - Uh, delícia. Magrinha com bundinha. Pernocas legais, cinturinha... só não gostei desse cabelo.
- É, também não sou chegado nessas modernidades. Mulher tem que ter cabelão.
- Também acho. Quando ela deita de frente pra ti fica aquele arco estendido no lençol.
- Pode crer. É legal de puxar também.
- É, apesar de que nem sempre sou adepto dessas fúrias. Às vezes tô meio “Supercine”, saca?
- Ah não, eu sou sempre “Tela Quente”.
- Fúria tem dia. Por exemplo, quinta e sábado são dias bons de fúria na cama.
- E nos outros tu é uma donzela?
- Nos outros eu sou mais tranqüilo sim. E tu, vai dizer que é sempre o Satanás na cama? Porra, por isso que tuas namoradas não ficam mais de um ano contigo.
- É. Eu poderia até inventar alguma coisa agora, mas a verdade é que nenhuma delas acompanhou meu ritmo até hoje mesmo.

Deram aquela golada no chopp e aproveitaram o intervalo para refletir meteoricamente sobre suas relações.

- E como ta a Débora?
- Tá legal, tá bacana.
- Pode crer...
- E a Regina?
- Numa boa. Mulher relax...
- Bacana, bacana...

Após a falta de assunto provocada pelo tema que eles não queriam levar à mesa, retomaram ao ritual dos goles, emendados no acender de cigarros e na primeira pausa para o banheiro. Na volta, foi a vez do outro. Os dois checaram se havia alguma ligação das respectivas no telefone celular. De volta à mesa, após muito tempo sem falar nada, foi a vez de retomar o embate viril:

- Bicho, e a Nanda, heim?
- Fodão...
- Ela é a única foda que a gente tem em comum, né?
- Não, rapaz, tá doido? E a Tina?
- Minha Nossa Senhora do Carmo! Como pude esquecer?!
- Não faça isso. A Tina, sob diversos aspectos, inclusive, é muito melhor que a Nanda.
- Eu não sei. A Tina é aquele boquete espetacular. Já a Nanda é aquele corpo inesquecível.
- Pois que eu gosto mais do corpo da Tina.
- Verdade? Ah, eu não. Sou mais a Nanda.
- Rapaz, falando nisso, me diz uma coisa. A Nanda te pediu cumshot?
- Não, eu que tive que pedir. Porra, ela que te pediu isso?
- Foi, cara. Um negócio impressionante.
- Meu Deus. Comigo teve um lance pitoresco só: ela resolveu se depilar toda uma vez.
- Toda?
- Sim, carequinha.
- Sacanagem, comigo tinha um monte de pentelho.
- É, mas tu ganhou o cumshot.
- Sim, sim... E a Tina?
- Sem cumshot.
- Mas em compensação...
- É, em compensação teve aquele pequeno e valioso brinde.
- É, uma mulher altruísta.
- Isso. Pelo menos a Tina foi mais justa conosco.
- Meu Deus, olha essa mulher que tá vindo!
- Viro na cara de pau pra ver?
- Vira, foda-se!
- Minha mãe do céu.
- Bicho, essa simplicidade do jeans, salto alto e essa blusinha branca sem sutiã deixa uma mulher dessas num nível muito acima de qualquer colegial ou essas executivas que estavam passando por aqui.
- Com toda a certeza!
- Mulher linda!
- Bacana. Bicho, por uma mulher dessas tu fazias uma merda?
- Toda a merda de mundo.
- Assaltava um banco?
- Sim.
- Deixava a esposa?
- Claro.
- Daria teu carro?
- Na hora!
- Pegaria gonó?
- Ah, vá se fuder...
- E se ela fosse um traveco?
- Rapaz... deixa eu ver...não, não, acho que não encarava.
- Meu Deus, tu ainda pensou...
- É que, sei lá, de costas ia parecer a mulher mais linda que peguei.
- Mas de frente poderia ser o maior pau que tu já pegastes também.
- É, definitivamente, traveco não.
- Tem certeza?
- Sim, mas se fosse operada eu comia.
- Ah, operada é outra coisa. É como se fosse uma nova vida, uma reencarnação.
- Ah, lá vem tu com catolicismo!

Rá rá rás muito altos ecoaram pelo interior do bar e fizeram pescoços virarem para a direção deles na mesa que ocupavam na calçada. Pediram mais duas cervejas e ficaram ali competindo o grau de masculinidade, que ninguém pediu para medir, quando tocaram os dois telefones ao mesmo tempo:

- Oi, amor. Sério, era às 20 horas?
- Oi, minha princesa. Não, tô saindo do escritório agora.
- Tá certo, amor, tô indo pra casa.
- Sim, sim, eu já tô indo pra casa.
- Não, amor, não vou demorar. Em 30 minutos estarei aí.
- Claro que não, minha princesa. Não tem happy hour hoje, vou direto pra casa.
- Tá, te amo, viu? Beijos.
- Certo, minha princesa, te amo. Tô chegando em 30 minutos.
- Tchau.
- Tchau.
- E aí, a saideira?
- Não, rapá, a Débora vai me matar se eu me atrasar.
- Melhor então, assim eu tenho tempo de comer alguma coisa e disfarçar o cheiro da bebida.
- Beleza.
- Mestre, traga a conta.
- ...
- ....
- E a saideira, foda-se.
- É, a saideira... foda-se.

2 comentários:

. disse...

Isso parece uma conversa entre Rafael e Tylon.

Aline disse...

hahahahhaha